Meditações no Salmo 39

O meio cristão é cheio de “gurus”, “sabichões” e de supostos conhecedores dos mistérios e segredos espirituais. Não apenas pastores e líderes – tem muito também –, mas pessoas que frequentam igrejas locais entendem-se como habilitados a fornecer diretrizes e dar palpites em vidas alheias. Analisam com base nas informações que possuem – normalmente muito pouca e superficial – e destilam opiniões, diretrizes, mandamentos, leis e recados da parte de Deus – na maioria das vezes genéricos e clichês do evangelicalismo brasileiro. Algumas pessoas percebem-se como teólogos e teólogas, sem sequer ter formação adequada para o labor teológico. Gente que acha que encontrou a interpretação categórica de pontos difíceis – e secundários – das Escrituras. É fato que o meio religioso cristão está repleto de crentes que se sentem mais “santos” do que os outros, mais “entendidos” do que os outros, mais “espirituais” do que os outros, mais “sábios” do que os outros. São pessoas que, embora a aparência piedosa – há muito esforço humano para construir essa pseudo piedade –, o coração está tomado por vaidade, arrogância e soberba.

Nada mais contrário a espiritualidade bíblica e humildade cristã genuína. Na contramão do quadro citado, o salmista exala em sua oração sua condição de contradição e de limitação. Diferente de quem deseja se promover, quem ora confessa seu erro de forma categórica e autêntica, não para parecer gente “humilde” e “espiritual” diante dos ouvintes. Ao contrário, os segredos da alma são desvendados em uma confissão que coloca o confessor exposto em sua fragilidade e incapacidade de discernimento. Propondo-se a permanecer calado diante dos seus opositores, para não pecar com a língua, o que pareceria algo bastante sábio e espiritual, o salmista reconhece que não adiantou nada! Ele assume que sua prática religiosa foi inútil e que serviu tão somente para aumentar sua angústia e piorar sua situação interior.

Na sequência ele se abre completamente ao Eterno, orando com a alma. Questiona Deus, reconhece que não passa de um sopro, que é frágil, que a duração de sua vida é nada, que lhe falta sentido e propósito, que não está dando conta da existência. Por fim, suplica ao Senhor para que seja escutado, apela para a sensibilidade da parte de Deus em relação aos seus dilemas, reconhece que não sabe o caminho, pede ajuda e alívio. Chora. O salmista não é alguém que sabe “o segredo” da vida espiritual. Não se percebe dando conta de si mesmo, que dirá dos outros? O detalhe que não pode escapar: ele foi sincero em fazer a experiência da ignorância, reconhecendo-a em si mesmo. Não somos chamados para sermos conhecedores dos “segredos espirituais”, mas para sermos como o Filho: manso, humilde, servo.

Que a experiência da – nossa! – ignorância nos humilhe e nos leve para uma espiritualidade que faça brotar lágrimas em nossos olhos diante do Pai que nos vê em secreto, livrando-nos da vaidade e do egocentrismo disfarçados de vida piedosa.

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