Meditações no Eclesiastes 3.9-14

Insistindo em nos lançar para longe das obviedades e clichês, o sábio nos obriga a ver além das aparências. Sabemos que Deus é o Criador, que fez a vida, o humano e tudo o que há. Entretanto, o que Ele deixou de claro e explicado para todos nós acerca da existência? Temos muitas dúvidas na vida, embora muitos prefiram negar. Não temos acesso aos propósitos, aos mistérios e as respostas para as questões da vida.

A vida é um permanente paradoxo complexo. Vivemos oscilando entre a alegria e a tristeza, otimismo e pessimismo, certezas e dúvidas e assim por diante. O sol nasce para o justo e para o tolo. A chuva cai para o bom e para o mau. A justiça não vem no tempo que gostaríamos, mas às vezes é feita também. Em meio a esse furacão de emoções e sentimentos, convicções e incertezas, acertos e erros, estamos nós. Que ganha o trabalhador com o seu esforço? Não sabemos ao certo. Mas é certo que faz parte da vida o trabalho e Deus nos impôs esse tipo de atividade. Muitos trabalham sem encontrar sentido, fazem por fazer, não encontram um propósito nesse esforço.

Simultaneamente, surge outra questão: Deus faria algo assim, sem sentido para vivermos? Ora, tudo o que Ele faz não é Belo? Não conseguimos entender muitas coisas e temos dificuldade em encontrar o significado profundo da vida. Mesmo assim, Deus colocou a eternidade em nosso coração, uma sede por transcendência mesmo que estejamos pouco saciados diante da ausência de sentido. Aliás, mesmo na ausência de sentido, conseguimos nos alegrar, praticar o bem, comer, beber e achar satisfação com a recompensa do trabalho. Diz o sábio: isso é um presente de Deus. Mesmo que não percebamos o sentido e o propósito exato das coisas? Parece que sim. Ele ainda afirma que o que Deus fez, está feito. Tudo é do jeito que é. Assim é a vida! A conclusão desse lugar nebuloso em que o sábio nos pôs é que tudo é do jeito que é para temermos o Eterno. Que isso significa? A vida é um mistério. Mistério insolúvel. Há uma aparência de permanente incoerência, contradição e a sensação de que há sempre algo oculto ao nosso discernimento. Essa é a vida e assim Deus a fez. Parece que o tolo é o que acha que encontrou propósito para tudo. Não sabemos e não temos acesso a tais “propósitos”. Viver a vida bem é aceitar a sua estrada mistérica e, simultaneamente, se arriscar a percorrê-las. Aceitar esse convite parece ser o reconhecimento de que o Eterno é de fato um alguém que aparece e desaparece na estrada, se mostrando e se ocultando e que, diante dele, cabe-nos temer diante da nossa condição de permanentes aprendizes da vida. Quem sabe Ele está a nos ensinar a viver, crescer e amadurecer. Ensinar a assumir as rédeas nesses caminhos. Quem sabe estaria Ele nos ensinando que Ele é um alguém que está para além, um verdadeiro Mistério. Não há alternativa. Viver é mergulhar no paradoxo, se submeter a contingência e insistir em tatear e procurar o imponderável, se satisfazendo com o estado de permanente busca e só.

André Anéas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *