Meditações no Eclesiastes 1.1
O escritor do livro de Eclesiastes, independentemente de quem seja de fato, se coloca como um “mestre” ou, em outras palavras, “alguém que está em busca”. Sim, pois ser um mestre, um pensador, um filósofo e, inclusive, um teólogo, significa ser alguém que tem coragem para se colocar em uma busca pela Verdade. Isso não significa encontrá-la literalmente de modo absoluto. Significa uma disposição interior e honesta de estar nesse caminho investigativo acerca de tudo o que existe diante dos nossos olhos e, também, dentro das nossas almas.
O que é a vida? O que é a existência? Quem somos nós? Qual o sentido do nosso esforço diário? O que são as alegrias e prazeres cotidianos? Afinal, qual o sentido da vida? O livro do sábio, esse que sabe, é o livro de alguém que mergulhou na arte de perguntar, de observar e analisar as coisas do mundo ou, melhor dizendo, da vida. Nessa busca não há pressa. Há tempo, muito tempo de observação, de um olhar atento e depurado sobre como as coisas verdadeiramente são. Reforço: ser um “sábio” nesse sentido envolve coragem. Por quê? Coragem para encarar de frente a realidade da existência, correndo o risco do solo seguro que sustenta as nossas justificativas da vida ruir e ficarmos sem chão. Coragem para, uma vez sem o chão dos nossos sistemas de plausibilidade, repensarmos nossos conceitos, ideias, teologias, filosofias e pensamentos. Reajustar, fazer novas sínteses e, até mesmo, jogar fora o que não nos serve mais. Não se trata de um exercício pontual, mas sim de uma disposição permanente de rever nossas dúvidas e respostas. Aliás, coragem para assumirmos as dúvidas e interrogações como coisas boas. Afinal, somente duvidando e questionando seremos capazes de amadurecermos. Coragem para mudarmos de rota e de norteadores em nossa caminhada. Coragem para deixar o velho para trás, preservar as lições aprendidas e criar o novo no tempo que se chama hoje. Coragem para duvidar de si mesmo (e rir um pouco também). Coragem de não aceitar as obviedades e clichês. Coragem para se reinventar, assumindo-se como um alguém que é capaz de se metamorfosear enquanto se anda no caminho de quem não tem medo de pensar. Esse é o grande convite do sábio: adentrar uma intensa, incessante e corajosa busca que, em si mesma, já produz em nós o sentido de viver e que tem o potencial de abrir os nossos olhos para o que está diante dos nossos narizes e não somos capazes de ver.
Que seus olhos sejam abertos, caso tenha coragem de viver a aventura de pensar a vida.
André Anéas