Meditações no Eclesiastes 1.5-7
O sábio observa tudo atentamente, desejoso de obter respostas, doa a quem doer. Ele para e percebe algo fundamental no funcionamento do mundo: movimento. O sol nasce e se põe todos os dias; o vento sopra para o sul e depois para o norte recorrentemente; os rios insistem em ir para os oceanos que nunca se enchem, mas sempre recebem as águas dos rios. Inicialmente ele detecta a obviedade: tudo é sempre igual, repetitivo e até monótono. A vida é um ciclo sem fim, que insiste em se repetir, em um movimento perpetuo das mesmas coisas. Será somente isso? Será que não há algo além? A busca por significado e sentido na existência passa por alguns estágios.
O primeiro deles é olharmos as coisas e termos a coragem de dizermos e afirmarmos a monotonia da existência.
Em um segundo momento, devemos estar dispostos a ir além do óbvio: parece que há a mais a ser discernido do que movimentos repetitivos.
Nesse instigante desafio que nos é proposto, de não aceitar a vida como algo entediante, aprendemos a discernir que a vida ser movimento é algo que muda tudo. As coisas não são estáticas, paradas, petrificadas. A vida está pulsando, o sol insiste em nascer e se pôr, o vento segue soprando e tomando seu curso e as águas fluem. Está aí uma lição bonita para cada humano, perceber como estamos inseridos em uma existência dinâmica. A natureza se exibe para nossos olhos, em uma dança coordenada, esbelta e contagiante. Assim deve ser a vida, movimentada, criativa, cheia de possibilidades e cheia de beleza. Também é possível aprender que nós, humanos, que às vezes temos vontade de desistir, de parar, de se entregar frente ao desânimo, podemos sempre recomeçar. Afinal, não seria a vida permeada pela possibilidade de novos começos, como o sol, o vento e as águas nos ensinam? Não estaria a natureza a falar sobre esperança, perdão, do novo? Quem sabe não é sobre as chegadas e a permanência em um determinado local que julgamos por bom, mas sobre um caminho de altos e baixos, de aprendizado constante e contínuo, em uma dialética – idas e vindas – que vai, dia após dia, nos tornando pessoas diferentes, melhores, mais sábias.
Poderíamos até mesmo supor o seguinte: o sol, o vento e as águas, não estariam nos dando um recado enquanto humanidade, do tipo: “ei, nós nos movimentamos sem sentido, mas vocês podem discerni-lo”. Nós não somente estamos em movimento junto dessa natureza dançante, mas damos significado ao movimento. Não somos meramente instintivos, mas seres reflexivos.
Ou seja, por que aceitar a monotonia?
Quais detalhes que diferem um pôr do sol do outro?
Quais sensações proporcionam cada brisa que sopra?
Qual o significado de cada correnteza que nos arrasta?
Há beleza em cada detalhe das cenas que estão diante dos nossos olhos. Há algo a ser contemplado em cada instante criativo de tudo que se move. E, em nosso movimento de perceber o movimento, encontramos sentido em nossa vida. Não que devamos ser chatos de ficar “filosofando” em cada segundo, mas sábios em desfrutar do sol que nos aquece com temperaturas diferentes, do vento que sopra em diversas velocidades e das águas que andam com intensidades distintas. Saber apreciar o movimento da vida é saber vivenciar a superação da monotonia da vida que insiste em se movimentar.
André Anéas