Meditações no Eclesiastes 6.10-12

Nossa teologia é muito pretenciosa. Ela se entende como detentora de um tipo de conhecimento acerca de Deus e seus mistérios que acaba por tornar tudo conhecido e esclarecido. O resultado disso é que Deus, essencialmente misterioso, se torna um alguém escrutinado, desvelado por completo. Imagina alguém achar que consegue explicar as ordens dos decretos divinos na eternidade?! Ou propor com elevado grau de “assertividade” o cronograma do fim do mundo?! Ou ainda, contar como será a eternidade, quem estará no céu e no inferno, bem como saber algo da mobília celestial?!

Esse tipo de “conhecimento teológico” acaba, na verdade, por tornar o humano desonesto intelectualmente ou muitíssimo ingênuo. Em ambos os casos, as consequências são tristes. Uma igreja soberba do seu pseudointelecto e/ou que entende a fé como uma espécie de ferramenta que manipula a divindade de acordo com os seus próprios interesses. Tanto a soberba como a manipulação de Deus através dessa “fé” são consequência de uma teologia que funciona como criação de ídolos, à nossa imagem e semelhança. O sábio, profundo investigador da realidade, é cirúrgico em sinalizar um dado da realidade: nosso intelecto, linguagem e palavras são sempre insuficientes para darmos conta dos mistérios da vida e, especialmente, de Deus. Que dirá do além-mundo? Temos intuições e percepções, não certezas absolutizadas. Diante dessa constatação, não resta outra postura a não a humildade diante da vida e do Eterno. Dessa humildade em saber que não se sabe nada, nasce outro tipo de fé. Quem sabe seja esse o interesse do sábio… Nos provocar diante das contradições e incertezas da realidade. Quem garante o que nos acontecerá? Tudo pode acontecer!

Somos como a neblina que dissipa, névoa que se esvai… Não gerimos a maioria das variáveis da vida e estamos imersos em contradições das mais diversas. Como serão nossos filhos, casamento, profissão? Seremos bem ou mal-sucedidos profissionalmente? O cano da pia vai furar? Quando o nosso carro nos deixará na mão? Teremos recursos até o fim do mês? Não há controle sobre a vida em sua plenitude. A fé é a coragem de ser mesmo diante do nosso não saber. As muitas palavras são, de fato, um “vazio” que nada agrega para revelar os mistérios da existência. Resta a fé que sabe reconhecer que a vida é um mistério e é só de viver.

André Anéas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *