Meditações no Eclesiastes 3.15-22
Nessa semana um policial militar jogou de uma ponte um homem como se fosse um saco de lixo. Lendo a provocação do sábio e diante de uma atrocidade desse tipo, é possível entender sua frustração com a humanidade. Realmente nos cabe aqui a mesma pergunta: será que somos melhores que os animais?
Nós morremos e os animais morrem; nós respiramos e os animais respiram. Pior: duvido que um animal jogaria um outro animal de uma ponte só por jogar… Quando observamos a vida nua e crua percebemos um mal que adentrou as vísceras da existência, pervertendo tudo. No lugar da justiça, há impiedade; no lugar da retidão, mais impiedade ainda! Que nos resta? Será que temos alguma alternativa ou cederemos ao pessimismo – mais que justificado – do sábio que pensa a vida e mundo? Ele tenta esboçar uma saída. Seria tudo um teste de Deus para comprovar que, de fato, não somos melhores que os animais. Que teste terrível! Deveríamos almejar sermos reprovados no teste, pois como não seríamos mais justos, dignos, corretos que o mundo animal que simplesmente vive de modo instintivo? Ou seria o contrário?
Diante do mundo animal, em que ninguém joga alguém de cima de pontes, deveríamos ser melhores do que somos nos igualando, ao menos, as bestas feras do mundo? Que situação desastrosa que nos metemos! Em nossa arrogância arrogamos sermos a “coroa da criação”… Seríamos, mesmo, melhores assim que todo o resto da criação? Será que a provocação do sábio não é justamente esta? Falta a nossa humanidade uma humildade genuína, pois, ao sucumbirmos à nossa arrogância nos tornamos os piores dos piores, achando que somos “deuses” e podemos tudo, até matar o nosso semelhante. O sábio ainda nos deixa mais encurralados, pois nem mesmo o juízo eterno ele nos dá como impulso para a justiça. Ele questiona: quem realmente sabe o que haverá depois da morte? Seria o espírito humano melhor do que os dos animais? Que nos resta? Insisto: parece que falta humildade para assumirmos nossa culpa e tomarmos as rédeas da responsabilidade perante a vida. Não acredito que é simplesmente se divertir e aproveitar o resultado do trabalho.
Tão pouco acredito que devemos ser soberbos e nos acharmos superiores a toda a criação. E também não creio ser uma alternativa nos movermos pelo medo do juízo. Devemos, ao que me parece, reagir a todas essas provocações e nos perguntar: como posso contribuir para um mundo mais justo? Devemos nos indagar e não aceitar passivamente tudo isso que está diante dos nossos olhos. Cabe-nos ter esperança, pois fé só é fé quando crê apesar de tudo. Somente essa fé esperançosa, que não aceita a morte de um homem jogado de cima da ponte como um saco de lixo, poderá nos humanizar.
André Anéas