Meditações no Eclesiastes 5.13-17

A insistência do sábio em falar sobre as riquezas e o desejo insaciável do coração humano por elas é notória. Sem dúvida, depois de muita observação e da sua própria experiência ser desnudada em texto, o mal de se viver objetivando o acúmulo ficou nítido para ele.

Nesse momento, a sua provocação nos leva para a obrigatoriedade de olhar para outro lugar além da obviedade, que ficará mais claro nas próximas exposições. Qual a razão dessa troca de olhar? Simples: o acúmulo, o amor e a ambição pelas riquezas é uma armadilha e uma grande tolice. Quem as possui não tem garantia da felicidade, mas a grandíssima probabilidade da tristeza. O empenho e o esforço por obter e sustentar um cofre cheio impede a troca de olhar para o que verdadeiramente importa. Além disso, o sábio sinaliza o óbvio: a volatilidade da riqueza. Uma hora você a tem. Em outra circunstância não tem mais. Para os acumuladores há ainda outra camada de infelicidade: deixar de ganhar mais. Não significa tornar-se pobre. Mas dentro dessa lógica – que está no coração de muitos na sociedade de mercado contemporânea –, é um tipo de “perda” mais que o suficiente para não se ter paz de espírito.

As armadilhas do amor ao dinheiro podem, inclusive, resultar na impossibilidade de se deixar herança para quem se ama. Ou por perder o que se imaginou que ficaria para os filhos, ou até mesmo pela herança ser o motivo do ódio dos herdeiros, que brigam pelo “cavalo de tróia” que a riqueza de tornou. A tolice aparece quando o humano perde de vista o que é nítido: entramos e saímos desse mundo nus, precisando de ajuda na chegada e muitas vezes na saída. Dinheiro, por mais que seja acumulado de forma egoísta, não muda esse fato. Que isso significa? Que a verdadeira felicidade não pode estar na artificialidade daquilo que se conquistou, que não veio conosco para o mundo e que não irá para o além-mundo.

Achar que o bem-estar está vinculado a trabalhar para obter recursos materiais é vento, sopro, névoa, é nada. Chegamos e vamos dessa terra. Qual o propósito debaixo desse sol? Qual o propósito dessa vida que leva o acumulador à solidão, frustração, doença e ira, do mesmo modo que o pobre? Certamente não são as riquezas que se acumula. “Que adianta ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?”, questionou Jesus de Nazaré. Aquele era rico e se fez pobre para nos tornar ricos sabia que a verdadeira riqueza está na satisfação de uma vida simples –, afinal, Deus para ser rico não precisa de um cofre estilo “tio patinhas”. Quem não sabe se satisfazer e se contentar com o pouco, será presa fácil de Mamon. Não é à toa: no evangelho, não há outro caminha que não seja o de uma vida despojada e livre do peso das riquezas.

O humano nu, que não têm acúmulo de nada, pode ser alguém cheio de amizade, generosidade, partilha, misericórdia e bondade. Feliz mesmo é quem aprende a se contentar na nudez que nos trouxe e nos levará daqui.

André Anéas

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